Ateliê Literário | Edição 51 - Dezembro/2024

Notas de Trilha

Ilustração: Fernando Siniscalchi

Jaquiceli Larroza Chafer

* Texto produzido a partir da oficina “Literatura com som na caixa: trilhas sulinas brasileiras”, ministrada pela professora e escritora, Deise Abreu Pacheco, na Biblioteca Parque Villa-Lobos, em outubro de 2024.  


Primeiro movimento

 

Ele voltou como uma chuva de verão, não esperada tampouco pasmosa.

Perguntou porque não se viram mais, ela pensou sobre tantas respostas e não encontrou a que contava uma verdade simples. Quanto mais se investigava menos sabia de si, era seu mapa sem saber o que o constituía.

A conversa rumou para um lugar não comum a eles, o homem pediu-lhe que fosse até uma igreja por nove semanas. Pedido curioso para ela que era tão ruim católica, nada sabia dos ritos. Igreja, templo, terreiro, centro, mesquita, capela, era de todos um pouco e de nenhum completamente.

Decidiu ir, não pela pura fé, mas por ser dia de corrida.

Havia chovido e ficado no ar um calor bafento, como se um dragão com problemas de digestão, sem poder expelir seu fogo, desse um grande arroto.

Enquanto corria pelas ruas conhecidas, desviava das poças, não todas e a água entrava pelo tênis, como os sons dos carros passando entravam em seus ouvidos, apesar de ouvir insistentemente uma música que tocava no compartimento musical da mente: “This Never happened before (This Never happened before)”.

Quando chegou à porta da igreja, não sabia o que encontraria, se ele, Deus ou ela.

Deu um passo e entrou.

 

Segundo Movimento

 

Ex querido,

Sinto muito.

Sei que disse que eu só usava contigo, mas depois de tantos anos usando da mesma forma, fui não sabendo mais usar. Feito quando se fica à frente do guarda-roupa sem saber o que usar, mesmo tendo ali tantas peças.

Deixaste de ser para mim sítio, com cheiro de café pela manhã e pães assados no fogão a lenha para tornar-se sertão com sol quente, que faz ficar chapado sem nada se usar, num estado psicodélico.

Depois de tantos anos do fim, sinto uma sensação de reconciliação.

As grandes mágoas geradas pelo desentendimento de brigas economizadas, se desvanecem.

Agora não uso para você nem para outro: “I’ve got a secret smile and you use it only for ME”.

 

Terceiro Movimento

 

Como romper o limite interno e tornar-se rosa vermelha?

 

Quarto Movimento

 

Ao juntar seu pote de coragem e rebeldia, farás o ar cheirar a limões e verás altos bambus plantados em chão de cimento queimado, balançarem. E ultrapassando o senso comum romperás os limites impostos por si.