Edição 24 - Setembro/2022 | Editorial

Modernista e cristão

O projeto Literatura Brasileira no XXI joga luz sobre algo que, de tão óbvio, é pouco abordado: o modernista, em regra, era profundamente cristão. Tal se dá por vários ângulos, a começar da formação católica de quase todos. Assim, para além dos que se alardearam convertidos, como Murilo Mendes, ou espiritualistas, como Cecília Meireles, um cristianismo cultural brota das obras modernistas.

Sob o signo da ruptura, estruturas clássicas e românticas foram abaladas. O discurso logicamente belo cedeu espaço ao absurdamente estranho, ou, ainda, o poeta inspirado na natureza virou artista pirado em urbanidade. Mas a mística cristã predominou. Cantando a urbe paulista, Oswald de Andrade dispõe um padre a parar o trânsito. Entregue ao pessimismo, Carlos Drummond ainda faz o sinal da cruz. Mesmo quando desce ao inferno, o Orfeu de Jorge de Lima está rodeado de anjos. 

A oficina “Modernidade e as formas do rito” revelou essa face religiosa, ora em bases teológicas, ora com raízes cotidianas. Para Pablo Simpson, pesquisador do assunto no Brasil e na França, o vanguardismo nem sempre se opõe à espiritualidade. Autor de O rumor dos cortejos: poesia cristã francesa do século XX, mostrou que, entre nós, o modernismo ritualiza a ruptura, mas isso não vira anti-cristianismo, mesmo com críticas à fé institucionalizada.  

Assim, quando Mário de Andrade foi chamado de “sumo pontífice” do modernismo, já na década de 1920, talvez não se tratasse apenas de metáfora. Talvez fosse a consciência de que aquele que convence os pares sobre seus ideais prática, de fato, um apostolado. Ora, o que fizeram líderes de vanguarda dentro e fora do Brasil? Espalharam sua boa-nova em revistas ou conferências, ainda que recheadas de iconoclastia.


Leia também

O sertão em cada um

O Povo Brasileiro (1995), de Darcy Ribeiro (1922-1997), vem norteando oficinas do projeto Literatura Brasileira no XXI. Neste mês de março, o foco é o Brasil Sertanejo, cujos traços culturais, econômicos e sociais são localizados pelo estudioso principalmente na região que hoje chamamos de ...

Leia Mais!
Caipira: um causo do Brasil

Inspirado no Povo Brasileiro (1995), de Darcy Ribeiro (1922-1997), o projeto Literatura Brasileira no XXI segue com seu novo ciclo. Depois da primeira ação mais panorâmica, a segunda concentra-se numa das cinco unidades geográficas, econômicas, étnicas e culturais do país: o Brasil caipira.S...

Leia Mais!
Literaturas dos Brasis

O projeto Literatura Brasileira no XXI abre novo ciclo, voltado às nossas diversidades regionais. Inspiradas no Povo Brasileiro (1995), de Darcy Ribeiro (1922-1997), as oficinas visam discutir a literatura de cada Brasil descrito nessa obra fundamental: caipira, sertanejo, caboclo, crioulo e sulin...

Leia Mais!
Em todos os tempos: vozes indígenas

O projeto Literatura Brasileira no XXI fecha o ciclo de oficinas em defesa da democracia. Sabíamos que o tema era relevante, diante do ambiente político tomado por sectarismos. Queríamos contribuir para o debate, exercendo nossa função cultural, educacional e social. E de saída, com os ataque...

Leia Mais!
Em todos os tempos: vozes indígenas

O projeto Literatura Brasileira no XXI fecha o ciclo de oficinas em defesa da democracia. Sabíamos que o tema era relevante, diante do ambiente político tomado por sectarismos. Queríamos contribuir para o debate, exercendo nossa função cultural, educacional e social. E de saída, com os ataque...

Leia Mais!
Corpo negro de mulher: consciência

Desde o início em 2020, o projeto Literatura Brasileira no XXI vem propondo ações pelo Dia da Consciência Negra (20/11). Já são quatro oficinas que geraram tanto produções literárias quanto críticas, um rico material disponível em nosso portal. Nunca é demais defender a igualdade racial...

Leia Mais!